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O Machado de Xangô - Conto

Noite de quarta-feira, Astolfo sai pontualmente do serviço ás 18:30 horas em direção a sua casa e ao merecido descanso. Merecido ao seu ver pois na verdade Astolfo procrastinou praticamente o dia todo deixando o recém contratado estagiário sobrecarregado, além de culpá-lo por não ter conseguido terminar todos os relatórios em tempo.

No caminho para casa, que hoje Astolfo está fazendo a pé, ele passa por uma pequena casa de madeira, repleta de flores no portão, com som de palmas vindo de dentro e um forte perfume de ervas. Está diante de uma casa espiritualista, uma pequena tenda caseira de Umbanda que está em obrigação à Xangô. Para diante do portão de onde consegue avistar algumas pessoas vestidas de branco, colares coloridos no pescoço, pés descalços. Observando mais um pouco ele consegue avistar uma mesa próxima a uma parede onde estão dispostas algumas imagens. Dentre as imagens Astolfo consegue reconhecer algumas, como a de Jesus com os braços abertos no ponto mais alto da mesa, e também a de Nossa Senhora Aparecida. Outras são familiares porém ele não consegue identificar de onde as conhece. Outras são totalmente desconhecidas como a de um senhor negro sentado num toco e aparentemente fumando um cachimbo, ou a de índios portando arcos e fundas. Mas de todas as imagens a que mais chamou a atenção de Astolfo foi a de um homem negro, usando um saiote vermelho e branco, coroa dourada na cabeça e dois machados nas mãos. Mais tarde ele descobriria que era a imagem representativa de Xangô, Orixá da Justiça, dos raios, do fogo vulcânico e o homenageado da noite.

Uma das pessoas de branco, uma moça loira de aparentemente uns 23 anos,  ao dirigir-se ao portão com um prato de farofa e uma jarra de água, acabou assustando o observador atento ao bater palmas enquanto cantava algumas palavras incompreensíveis a ele, das quais ele se recorda somente de ouvir "Laroie Exu, abre nossos caminhos e protege a nossa engira". Sobressaltado com a repentina aparição Astolfo tropeça nos próprios pés e quase cai não fosse amparado pela moça no portão.

Após recobrar-se do ocorrido, agradece a jovem moça e decide prosseguir caminho à casa. Porém as pernas não obedecem ao comando do cérebro e decidem não se mover. A moça toda prestativa chama uma das pessoas de dentro da casa e juntos levam Astolfo para dentro, que além de imóvel, ficou branco como as roupas usadas pelas pessoas de dentro da casa.

Já dentro do terreiro, envolto pelo cheiro das ervas, som das palmas e depois de receber alguns chacoalzões de outra jovem moça, esta branca mas de cabelos ruivos, que comportava-se como alguém com fortes dores nas costas e usando bengalas, Astolfo recobra a consciência e devagar vai sentindo novamente as pernas.

A jovem ruiva, num vocabulário que lembrava o século XVII pergunta:
- Tudo formoso mizifiô? Mizifiô é bem vindo nesta casa. Xangô trouxe vossuncê até a casa dele pra dizer a vossuncê que mizifiô precisa mudar os modos como anda fazendo as coisas. - fala  a jovem entre uma tragada e outra de um cachimbo - Mizifiô ganhou hoje do Orixá da Justiça a última oportunidade de mudança. Mizifiõ tem agido mal no trabalho, tem maltratado os curumim que faz mais de três luas grande que num vê o pai,e essa nova rabo de saia que vossuncê encontro, vossuncê vai tratar como animal como fez com as outras?

- Quem lhe disse tudo isso? - questiona Astolfo assustado- Que tipo de brincadeira é essa?

- Quem me disse fiô? Ninguém precisa dizer nada pra nega veia não. Nega Veia Vó Juventina vê tudo na aura de vossuncê. A aura da gente é como os traço do dedo, dizem quem somos e o que fazemos. - Responde a jovem, explicando também tratar-se não da moça que ele vê, mas de uma entidade espiritual, uma preta velha, que atende pelo nome de Vó Juventina da Bahia - Vossuncê é médium fio, é mensageiro dos Orixás é cavalo dos guias, e Xangô trouxe filho até aqui pra mostrar caminho novo.

Terminando de falar isso a preta velha faz sinal em direção a um grupo de pessoas que começam a cantar uma cantiga mais ou menos assim:

" São João Batista é Xangô, é dono do meu destinho até o fim. Se um dia me faltar, a fé no meu senhor, que role essa pedra sobre mim"

Ao som do cântico e das palmas que o acompanharam, Astolfo começou a sentir-se estranho, tonto, como se algo, não, como se alguém o empurrasse pelas costas. Algo dentro dele começou a pulsar mais forte seguindo o ritmo das palmas, até que ele perde o comando dos sentidos e seu corpo já não o obedecesse e todos em volta percebem quando Astolfo, agora incorporado com o Orixá Xangô brada:

" Kaô. Kaô"

E enquanto brada, Xangô de posse do corpo de Astolfo, dança, canta e distribui seu axé para os presentes. Vó Juventina levanta-se do toco onde estivera todo esse tempo sentada e prostrasse diante de Xangô, encostando a testa no chão por três vezes. Xangô mediunizado em Astolfo brada " Kaô, Kaô" mais uma vez e desincorpora, ou sobe como explicou Vó Juventina, voltando para o Orun morada dos Orixás.

Astolfo, mais assustado do que nunca estivera em toda sua vida, ao tomar novamente controle e consciência do seu corpo vira-se em direção a saída do terreiro e começa a dirigir-se até ela. Ao cruzar os umbrais da porta ouve a voz de Vó Juventina alertando-o:

- Xangô é duro como a pedra, mas também é misericordioso. Se vossuncê decidir mudar e ser uma pessoa melhor para você e para os outros Xangô muda a sentença, caso permaneça no erro, ainda hoje ele vem buscar mizifiô.


----- Continua-----

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